TARÔ

A história das cartas do Tarô

Acredito que, de todos os oráculos, o Tarô seja o mais popular e o que mais fascina tanto leigos quanto especialistas. Seu fascínio deve-se à enorme gama de sentidos atribuídos às suas enigmáticas cartas, que ilustram praticamente todos os aspectos da vida. Seja para leituras simples, como descobrir as energias que influenciarão o seu dia, ou para leituras e estudos mais complexos, como traçar os aspectos de personalidade diante de questões existencialistas e metafísicas, as cartas do tarô são a ferramenta perfeita para quem busca um novo olhar diante do desconhecido.

O Tarô possui muitas histórias de origem, como lista a autora Rachel Pollack, para uns o tarô remete a mitos sagrados dos povos ciganos, para outros ele deriva de ensinamentos de números secretos da escola Pitagórica. Ou então as cartas vieram de Atlântida. Ou ainda que elas vieram de um deus egípcio chamado Thoth, senhor do conhecimento. Porém o que se tem historicamente registrado sobre a origem do tarô, pode não soar tão mitologicamente épico, mas é ainda assim muito fascinante.

A história de Visconti-Sforza

O baralho de tarô mais antigo que se tem registro é de 1450, originário de Milão / Itália, ainda que não fosse um tarô propriamente dito. Provavelmente ele foi pintado por um artista chamado Bonifácio Bembo, e as cartas serviram de presente de casamento, celebrando a união de duas grandes famílias os Visconti e os Sforza.

O Duque Filipo Maria Visconti foi um dos homens mais ricos da Itália, mas que, além de ter suas terras constantemente ameaçadas por invasão de outras cidades-estados, ele não possuía herdeiros. Até que em 1425, Filipo teve sua primeira filha, a quem chamou de Bianca. Ela foi educada com estudos clássicos, música, arte, ciências e na companhia do pai, caçava e cavalgava.

Enquanto isso, na familia Sforza, Muzio Attendolo nasceu entre agricultores, mas ele saiu de casa ainda jovem para se tornar um mercenário condottiere, que eram soldados contratados para defenderem cidades-estado. Attendolo foi apelidado de Sforza, que quer dizer forte, por causa de suas habilidades em combate. E não demorou para que Sforza criasse seu próprio exército de mercenários. Após sua morte, seu filho Francesco assumiu o controle e elevou o status de seu exército para o de mais poderoso da Itália. 

Quanto Visconti viu sua cidade, Milão, sob ataque de venezianos, convocou os Sforza para defendê-la. Filipo ofereceu a mãe de Bianca para Francesco, como recompensa por seu sucesso nos combates. O casamento ocorreu em 25 de Outubro de 1441. Mas somente em 1450 que Francesco assumiu o ducado de Milão, ele precisou lutar para conquistar o trono do falecido sogro.

O casal teve muitos herdeiros. Bianca se envolvia em assuntos do governo, tornando-se patrona de hospitais, artes e igrejas. Ela chegou a vestir armaduras e lutar em batalhas contra as novas investidas de Veneza. 

Os Triunfos

Para celebrar os 10 anos de casamento, Francesco contratou o artista Bonifacio Bembo para criar um baralho de cartas para o casal. A arte como presente era comum, e como retratos já eram de praxe, a moda era presentear com os baralhos personalizados. Essas cartas eram inspiradas nos triunfos, que nada mais eram do que antigos desfiles alegóricos, que aconteciam nas ruas, desde a Roma antiga. 

No tempo do império os triunfos homenageavam generais que retornavam vitoriosos das guerras. Com o passar do tempo, na idade média, a igreja cristã passou a influenciar os desfiles, onde o clero seguia carruagens com artefatos religiosos e eram seguidos por músicos. Já durante o Renascimento, os desfiles assumiram uma estética mais carnavalesca, com diversos carros alegóricos ilustrando heróis e vilões, ou então virtudes como temperança, justiça e fortaleza.

O poema Os Triunfos, de Petrarca, era bastante conhecido na época, até por plebeus. E seus elementos influenciaram a criação de algumas cartas. O poema retrata um jovem que retorna ao lugar onde conheceu seu primeiro amor. Ele adormece debaixo de uma árvore e sonha que a vida é um triunfo. O homem, quando jovem, é conquistado pelo amor. Quando envelhece a castidade vence o amor. A morte triunfa sobre a castidade e a fama vence a morte, permitindo que o nome do homem viva para sempre. Mas, no fim, a fama perde para o tempo. Só a eternidade vence o tempo. 

A trajetória do Tarô, desde os salões aristocráticos da Renascença italiana até os consultórios esotéricos contemporâneos, revela muito mais do que simples cartas ilustradas. Ela nos mostra como símbolos, mitos e histórias pessoais podem atravessar séculos e ainda dialogar com nossas inquietações mais profundas. O baralho Visconti-Sforza não foi apenas um presente de casamento — foi um testemunho artístico de poder, amor e espiritualidade, que ecoa até hoje nas leituras de Tarô mundo afora. Ao embarcar nesse universo, não buscamos respostas definitivas, mas sim novas formas de enxergar o que já está dentro de nós. E talvez seja esse o verdadeiro triunfo do Tarô: sua capacidade de eternizar o humano através da linguagem dos símbolos.

Fontes:
O Tarô Dourado – Visconti-Sforza, de Mary Packard, editora Pensamento.
Bíblia Clássica do Tarot – Jornada Completa, de Rachel Pollack, editora Darkside.

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