ACADÊMICOS - FILOSOFIA

O Fantasma na Máquina

A definição do homem como um ser composto pela dicotomia corpo e alma pertence ao senso comum e transparece no dia a dia em dilemas expressos na sabedoria popular como “quando a cabeça não pensa, o corpo padece”. Porém, a pesar também das reflexões de grandes pensadores quanto a relação corpo e alma, pode parecer que a crença nesse conceito seja um tanto dogmática.

O filósofo inglês Gilbert Ryle, defendeu, conforme o artigo de Pantaleão, que a ideia de supor o homem dividido em coisa externa e interna, como fez Descartes, uma espécie de dogma e chama essa crença de Doutrina Oficial. Ryle afirma que a dicotomia trata-se de um erro categórico, onde não podemos considerar corpo e mente termos do mesmo tipo lógico, tratando-se de uma questão de linguagem. Não podemos afirmar que existem corpos da mesma forma que afirmamos que existem mentes, pois a palavra existir tem um sentido para corpo e um sentido diferente para mente. Ryle, conforme Pantaleão, não pensa o homem como corpo e mente separados, mas “como um ser em constante dinâmica entre suas próprias estruturas e o meio em que está inserido”, sendo construído pela forma que age no mundo, com o mundo. Assim o pensamento e a ação podem ser colocados no mesmo plano, pois suas ações são expressões de sua disposição em relação às possibilidades de ações no mundo. O robô de Wittgenstein, idealizado por Teixeira, agiria de forma muito parecida, quando ele afirma “O meio ambiente colocará parâmetros para as regras que ele poderá seguir.” Mas este robô, na verdade, estaria ainda assim preso ao conceito de animal na natureza, como descrito por Rousseau.

Ryle chamou de fantasma na máquina a ideia de um ser pensante habitar um corpo, hoje o termo é utilizado nas obras de ficção científica para definir códigos de programação gerados automaticamente, que permitiriam às máquinas agirem contra a programação original, tendo assim livre arbítrio. O robô de Wittgenstein para ser o mais próximo de um humano precisaria ainda, por exemplo, negar uma ação no ambiente apenas pela disposição de negá-la. Sendo livre, em seu “espírito” para agir assim, ironicamente, sem nenhuma razão aparente.


REFERÊNCIAS

DESCARTES, René – Discurso do Método. Meditações. Tradução de Roberto Leal Ferreira. São Paulo: Martin Claret. 2008.

PANTALEÃO, Nathália Cristina Alves – O sujeito “disposicional” de Ryle enquanto uma alternativa para o sujeito cartesiano. Filogênese – Revista Eletrônica de Pesquisa na Graduação em Filosofia. São Paulo, Volume 4 (1), 2011. Disponível em Acesso em: 16 de Outubro de 2014.

ROUSSEAU, Jean-Jacques – A Origem da Desigualdade Entre os Homens. Tradução Ciro Mioranza. São Paulo: Lafonte. 2012.

TEIXEIRA, João de Fernandes – O Robô de Wittgenstein. Disponível em: Acesso em: 16 de Outubro de 2014.

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